segunda-feira, 14 de maio de 2012

DOMINGO FERNANDES CALABAR




      "Entre as ruínas da Igreja Nossa Senhora da Apresentação, datada de 1630, (...) [vagueia] o vulto de Domingos Calabar, assombração que a sedícia e o malogro da invasão holandesa no Brasil obrigaram a penar sem resguardo." É assim que a escritora Nélida Piñom imagina, condenada a um sofrimento sem fim, a figura de Calabar, ao mesmo tempo herói e traidor da pátria, durante a invasão holandesa.
      De família humilde, filho de pai português e mãe indígena, Domingos Fernandes Calabar teve formação religiosa, estudando com os jesuítas. Em 1630, durante a invasão holandesa a Pernambuco, foi um dos primeiros a se oferecer para lutar, defendendo os portugueses. Deixou para trás gado e terras para se tornar combatente.
      Em 1631, os holandeses conquistaram Ilha de Itamaracá, mas a expansão de seus domínios foi muito lenta. A defesa brasileira, comandada pelo português Matias de Albuquerque, usava uma tática de guerrilhas e, por meio de emboscadas, enfraquecia o exército inimigo. Portugal, por sua vez, mandou como reforço uma armada de mais de 50 navios. Em setembro deste mesmo ano, também desembarcavam tropas espanholas para ajudar na defesa da terra.
      No entanto, o descontentamento dos brasileiros que lutavam ao lado dos portugueses aumentava cada vez mais, devido aos maus tratos que recebiam e o pouco reconhecimento que tinham pelos seus serviços. Por outro lado, os holandeses passaram a oferecer recompensas a quem com eles colaborasse.
      Em 22 de abril de 1632, Calabar se aliou aos holandeses. Embora o significado de seu gesto e suas intenções jamais tenham sido totalmente esclarecidos, as consequências de sua atitude mudaram os rumos do conflito.
      Domingos Fernandes Calabar aceitou o posto de major, que lhe foi oferecido, exigindo apenas informações detalhadas sobre o tratamento que seria dado aos brasileiros em caso de vitória holandesa. Em carta dirigida ao governador da capitania, Matias de Albuquerque, Calabar afirmou que passou para o outro lado não como traidor, mas como patriota, vendo que os portugueses e espanhóis tinham interesse em escravizar o nosso país.
      No período entre abril de 1632 e julho de 1635, Calabar foi responsávelo por grande parte das vitórias dos holandeses sobre os portugueses. Lutando contra seus antigos companheiros, revelou tudo o que sabia aos invasores. Com sua ajuda, os holandeses conquistaram várias cidades em Pernambuco. Incursionaram também, com sucesso, pelas capitanias da Paraíba e do Rio Grande do Norte, derrotando importantes centros de resistência hispano-portuguesa.
      Em março de 1635 os holandeses atacaram Porto Calvo, terra natal do próprio Calabar. Os portugueses fugiram, deixando os moradores submetidos aos holandeses. A única estrada em condições de ser usada na região estava vigiada por Calabar. O general Matias de Albuquerque, que se retivava para o norte da região, forçou passagem, atacando o local com sucesso.
      Domingos Fernandes Calabar foi preso e condenado. Seu nome ficou para sempre associado à idéia de traição. Um tribunal militar proferiu sua sentença. No dia 22 de julho de 1635,  Calabar foi submetido ao garrote e depois enforcado. Seu corpo, esquartejado, ficou exposto em praça pública.

Quem efetivamente foi Calabar?

       Domingos Fernandes Calabar foi um mameluco originário de Porto Calvo, povoado pernambucano onde, por coincidência, veio a morrer. Educado por jesuítas, tornou-se um brilhante combatente, direta ou indiretamente responsável por praticamente todas as vitórias dos holandeses sobre os defensores do território brasileiro no período entre abril de 1632 e julho de 1635.
      Antes encurralados no Recife por ações de guerrilha à moda brasileira, com a ajuda de Calabar os invasores flamengos conquistaram Conceição, Igaraçu, Itamaracá, Rio Formoso e Goiana, em Pernambuco, incursionaram com sucesso pelas capitanias da Paraíba e do Rio Grande do Norte e derrotaram o Arraial do Bom Jesus, talvez o mais importante ponto da resistência hispano-portuguesa, feita com a ajuda de brasileiros.
      A despeito de motivos e intenções, o major Domingos Fernandes Calabar fez aquilo que numa guerra recebe o nome de deserção e de traição: deixou os seus, passou-se para o inimigo e revelou-lhe tudo o que sabia, ajudando-o a combater seus antigos companheiros de armas.

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